quinta-feira, 21 de junho de 2012

O menino que não era de papel



Pedro era uma daquelas crianças geniais, sabe como é? Daquelas arrogantes por serem tão inteligentes? Pois é.. Desprezava a lição de casa, caçoava de todas as professoras e pior, tinha a mania de puxar o cabelo ou de dar uma pedrada na cabeça de todas as meninas que gostava. Sua cara nunca mudava também, desde que tinha 8 anos sua feição tinha se paralisado, sua mãe diz que foi choque térmico. O que não soube-se mais, era se Pedro realmente gostava dos filmes que assistia, do Mousse de Maracujá de sua avó, ou o que achava de ir a igreja. Pedro quase nunca falava, com o rosto paralisado então, mais difícil ainda de descobrir. Mas há algo interessante sobre Pedro que eu não contei, uma vez ou outra ele sentia dor, solidão, frio, sim, raríssimas vezes ele também experimentava esses sentimentos. Na primeira vez que aconteceu foi assim, seu gato de estimação adorado e grande companheiro fora atropelado na rua, Pedro saiu correndo ao ouvir a confusão, e que confusão ao ver.. Ele então sentou-se no chão, tudo era tripa, sangue, marcas de sangue, gato, marcas de gato. Sem querer, sim, sem querer, porque ele jamais iria se permitir a essas ousadias em sã consciência, caiu uma lágrima de seus olhos, de seus olhos crús, de seus olhos maus. E dessa lágrima, acreditem ou não, mas juro que foi exatamente assim que aconteceu, aquela composição de água e cloreto de sódio solidificou-se em uma pedrinha de ouro brilhante e dourada. Pedro levou um susto, se constrangeu, até incomodou-se, o que era aquilo? Que raios de criança era ele? Mas o pior de tudo pra ele foi ter chorado, aquela vergonha era incompensável.. Como ele, logo ele, pudera se dar ao papel de chorar, que vergonha.. Aquela lagriminha dourada nunca ia ser vista por ninguém, assim decidiu. Saiu correndo pra casa como se tivesse cagado nas calças de tamanho o desespero. E começou assim a história daquela incrível e solitária criança. Mas não se engane, Pedro não era daquele tipo esquizóide que se destaca na multidão não, ele se passava por normal, isto é, namorava, alguns amigos, nada muito íntimo é claro, e a única regra é que ele não poderia se deixar comover e nem deixar a bendita da lágrima escapar também. Se a coisa começasse a apertar, se sentisse seus olhos ardendo, Puff, ele já estava correndo para pegar seu frasquinho com suas 4 lágrimas de ouro, agora 5. Ora ou outra acontecia um desses milágres, como acontece na vida sabe? Pedro trabalhou, namorou, parou de trabalhar, fez sexo, arrumou um novo hobbie, arrumou um novo vício, largou o cigarro, começou com o charuto, fez sexo novamente, largou o charuto, deixou a igreja e trocou os amigos. Sem nunca dividir as tais lágrimas, nem nada perto disso. Quanta mesquinharia ein menino.. Quem sabe tivesse ido parar no Guinness, ficado milionário, ou apenas arrumado alguém legal pra ver tv em uma sexta-feira tediosa. Mas ele não conseguiu, e ele mesmo fez questão de me corrigir, que não era por maldade não, era mais falta de jeito mesmo. Um pouco de orgulho, um pouco de medo.. Quem sabe foram os efeitos colaterais de seu rosto paralisado. Pedro morreu aos 60 anos com 80 pedrinhas de ouro. É óbvio que precisou de um novo frasco. É que andava meio sentimental em seus últimos meses. Ninguém nunca soube. 

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